DISCURSO ALIENADO
A mais poderosa droga que conheci nesta vida.
Nem ópio, nem álcool, nem cocaína, nem tabaco,
Menos ainda maconha.
Amarra minhas mães atadas de algemas invisíveis
A cabeça dobrada pescoço ao cepo oferecido
Ovelha perdida em meio ao rebanho no imenso relvado,
Diante dos meus olhos a fuga dos solitários,
Via de fuga sem destino escrita de ofuscantes luzes,
A vida se escorrendo entre dedos sobre fugazes sinais binários.
E eu não vejo a vida passar,
Senão que a vida passa por mim e não vejo,
Feito quem entra num túnel,
E dentro dele sem saída o pensamento se esvai.
Deixo de ser o que sou,
E se sou não sou mais eu,
E sim alguma coisa que alguém quer que eu seja.
Sim, a mais poderosa droga que conheci,
Insidiosa que o mundo inteiro festeja,
Hora a hora do amanhecer ao anoitecer,
Igual sombra que segue e a todos arrasta
Madrugada adentro no quarto trancado,
Nas ruas, nas festas,
Da mais horrenda quimera toda calçada de vida tomada.
Esteja eu parado ao sofá pregado,
Na estrada dentro do carro,
A ela tela plana inteiro preso,
Homem em estado letárgico sem nenhuma vontade,
Os dois olhos hipnotizados e todos os sentidos
Sem o menor sentido na pequena tela a alma colada.
E é magia de toda cor,
Preta, branca, azul, vermelha,
Arco-íris de discórdia que isola,
Rede, cápsula eletromagnética a encerrar,
Cela,
Mente, coração e fígado ao sacrífico dados,
Maldita oferenda, é inútil resistir nem há o que jogar,
Tomado o veneno antídoto não há.
E se antes eu sabia o que fazia,
Hoje o que faço é estar nesse vago vagante estar,
Diante a parede líquida a se revelar,
A pergunta torta respondida,
Reposta num segundo dada,
Tanta coisa em cascata vista e revelada,
E nada,
Eu continuo sem saber
Sabendo apenas,
Isso de viver prisioneiro desta cloaca de imagens é mais que surreal,
Do mais fingir o existir combo total,
Passagem sem volta para um sítio de inteira total alienação real.
Talvez ainda reste algum tempo e
Valha perguntar:
-O que eu fazia antes de cair na rede,
O que eu fazia antes de estar conectado?
22.08.2017
Nenhum comentário:
Postar um comentário